
Sim, você não está ficando maluco — a Coca-Cola parece ter encolhido, o pote de Nutella virou um item de degustação, o pacote de biscoito agora tem mais ar do que conteúdo, e as barras de chocolate estão tão finas que já podem ser usadas como régua escolar. Tudo isso faz parte de um fenômeno econômico com um nome pomposo, mas consequências bem concretas: a inflação — e, mais recentemente, sua prima sorrateira, a shrinkflation.
Do ponto de vista técnico, a inflação é o aumento generalizado e contínuo dos preços de bens e serviços em uma economia ao longo do tempo. Conforme descrevem Mankiw (2021) e Blanchard (2017), trata-se de um desequilíbrio entre oferta e demanda de moeda: quando há mais dinheiro circulando do que bens disponíveis para comprar, os preços sobem. Em bom português, é o mesmo que inundar uma piscina com refrigerante — parece divertido no começo, mas logo fica impossível nadar.
Entretanto, há um detalhe sórdido: o governo, sempre disposto a “estimular a economia”, imprime mais dinheiro, aumenta gastos públicos, distribui auxílios, cria estatais, subsidia ineficiências e ainda jura que tudo isso é progresso. O resultado é previsível — e historicamente comprovado: a inflação dispara, corroendo o poder de compra do cidadão comum e estrangulando a indústria. Segundo Friedman (1963), “a inflação é sempre e em todo lugar um fenômeno monetário”, e quando o Estado se comporta como uma impressora Epson em modo turbo, os preços não têm alternativa senão subir.
Mas o mercado é criativo. Quando as pessoas não aceitam pagar mais caro, as empresas encontram um jeito de vender “a mesma coisa” por um preço “igual”. O truque? Diminuir a quantidade.

A Coca-Cola, por exemplo, já parece entender que o brasileiro moderno não precisa mais de 350 ml para se refrescar — 310 ml são suficientes para manter a ilusão de um momento feliz. A Nutella, por sua vez, adotou a filosofia do “minimalismo culinário”: aquele pote que antes dava para uma semana agora mal cobre uma torrada. Os fabricantes de biscoito, sempre preocupados com a saúde do consumidor, decidiram que menos unidades por pacote é uma forma de combater a obesidade infantil. E as barras de chocolate… bem, agora são “porções individuais”, termo elegante para dizer que você vai precisar de três para matar a vontade.
Economistas chamam isso de “reduflação” (ou shrinkflation): o ato de reduzir a quantidade ou o tamanho do produto sem alterar seu preço nominal. É uma maquiagem inflacionária que mantém as aparências, permitindo que o consumidor sinta que está pagando o mesmo — até perceber que o pacote acaba no terceiro punhado. Conforme Samuelson e Nordhaus (2010) explicam, esse tipo de ajuste é uma forma de defesa das empresas em mercados sensíveis ao preço, onde o aumento direto do valor levaria à queda brusca nas vendas. Em outras palavras, é uma mentira conveniente que mantém o sistema respirando.

Mas há uma segunda estratégia, ainda mais criativa — e talvez mais cínica: a mutação dos produtos em versões “falsificadas” de si mesmos.
Você já reparou que o “iogurte” virou “bebida láctea sabor iogurte”? Que o “suco” agora é “néctar” e, às vezes, “bebida de fruta”? Que o queijo ralado é “mistura para massas”, e a margarina é “creme vegetal sabor manteiga”? Pois é. A inflação, além de encolher embalagens, faz também descer o nível daquilo que cabe nelas.
Esse fenômeno é o reflexo de um processo de desvalorização qualitativa, em que os produtores substituem ingredientes nobres por versões mais baratas para manter o preço competitivo. Do ponto de vista técnico, isso é chamado de downsizing de qualidade (Hawkins & Mothersbaugh, 2019), e funciona como uma forma de “inflação disfarçada de inovação”. O rótulo muda, o gosto muda, mas o preço continua — e o consumidor, distraído, continua comprando.
A ironia é que essa “falsificação legalizada” acontece sob o olhar complacente das agências reguladoras, que permitem que o produto continue nas prateleiras desde que a nova identidade seja devidamente descrita em letras microscópicas – e que se pague a taxinha! É a institucionalização da enganação, e o consumidor precisa de uma lupa — literalmente — para descobrir o que está levando pra casa.
Do ponto de vista macroeconômico, essa estratégia revela algo mais profundo: o impacto corrosivo da inflação sobre a estrutura produtiva. Custos de matéria-prima, energia e transporte sobem continuamente, pressionados por políticas fiscais irresponsáveis e pela burocracia estatal. A indústria, incapaz de repassar integralmente esses custos ao consumidor (que já está no limite), responde com adaptações microeconômicas — reduzir o tamanho da embalagem, mudar o formato, alterar a fórmula ou disfarçar com slogans criativos do tipo “nova versão mais prática”.
No fundo, é o velho problema do governo tecnicamente incapaz e altamente controlador: cria obstáculos, eleva impostos, desvaloriza a moeda e depois acusa o “mercado ganancioso” pelos preços altos. Em economias livres, a inflação é uma exceção; em economias dominadas por tecnocratas, é uma tradição.

Enquanto isso, o consumidor vive uma comédia de enganos. O que antes era um pacote familiar virou “tamanho ideal para você”, o que era 1 litro virou 900 ml “para facilitar o transporte”, e o que era prazer virou estatística. Segundo dados do IBGE (2024), mais de 60% dos produtos alimentícios e bebidas sofreram redução de volume ou peso nos últimos cinco anos — um reflexo direto da persistência inflacionária e da incapacidade de políticas públicas de estabilizar custos produtivos.
Em última análise, o problema não é o chocolate que encolheu. É o Estado que cresceu.
A inflação é o sintoma de um sistema doente, viciado em gastar o que não tem, cobrar o que não deve e intervir onde não entende. A “shrinkflation” é apenas o reflexo de um organismo econômico que luta para sobreviver — e que, ironicamente, continua engordando o único setor que nunca emagrece: o governo.
E assim seguimos: com menos refrigerante, menos Nutella, menos biscoito, menos chocolate… e muito mais Estado.
Referências
- Blanchard, O. (2017). Macroeconomics (7th ed.). Pearson.
- Friedman, M. (1963). Inflation: Causes and Consequences. Asia Publishing House.
- Mankiw, N. G. (2021). Principles of Economics (9th ed.). Cengage Learning.
- Samuelson, P. A., & Nordhaus, W. D. (2010). Economics (19th ed.). McGraw-Hill.
- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2024). Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA. Rio de Janeiro: IBGE.
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