
Imagine acordar um dia e descobrir que seus direitos não são mais garantias inalienáveis — mas concessões condicionais.
Imagine que, antes de exercer qualquer liberdade, você deva convencer alguém — geralmente um funcionário público mal pago, mal treinado e mal humorado — de que você merece exercê-la.
Direito de ir e vir
Você diz:
— Preciso sair de casa para trabalhar.
O Estado responde:
— Mas você pode trabalhar de casa. Home office é tendência.
Você insiste:
— Preciso ir ao mercado.
— Delivery. Muito mais moderno.
— Preciso levar meu filho ao médico.
— Atendimento por telemedicina. É 2025, cidadão.
Até que alguém conclui:
— Sair de casa é uma escolha. Não é essencial. Comprove por que não pode viver trancado.

Direito à liberdade de expressão
Você tenta publicar um artigo:
— Preciso alertar as pessoas sobre um problema real.
— Já checamos os fatos por você. Sua opinião não passou no algoritmo.
— Quero cantar uma música.
— Pode, desde que não ofenda ninguém, não cite religião, política, gênero, raça ou qualquer coisa que lembre a vida real.
— Quero postar uma piada.
— Humor agora precisa de registro, classificação indicativa e laudo psicológico.

Direito de reunião
Você convida amigos para um churrasco.
— Ajuntamento suspeito.
— Cinco pessoas já é aglomeração.
— Três pessoas com a mesma opinião é célula extremista.
Você argumenta:
— Mas somos só amigos.
— Relacionamento interpessoal é privilégio. Cadastre seus vínculos afetivos na plataforma do governo e aguarde deferimento.

Direito à liberdade religiosa
Você diz:
— Quero professar minha fé.
— Somente se for aprovada pelo comitê inter-religioso nacional. Qualquer doutrina com inferno, pecado ou absolutos morais será vetada por incitar sentimentos negativos.
— Quero rezar em público.
— Ofensa sensível ao transeunte agnóstico. Três autuações e você vai pra reeducação espiritual.

Direito à educação
Você quer ensinar seus filhos em casa.
— Educação é monopólio do Estado. A liberdade de ensinar só vale quando for no padrão MEC.
Você quer escolher o conteúdo.
— Perigoso. Você pode estar transmitindo ideias não alinhadas com os valores universais da… Organização Internacional da Inclusividade e Sustentabilidade Afetiva (O.I.I.S.A).

Direito à propriedade
Você tenta comprar um carro.
— Mas você precisa MESMO de um carro? O transporte coletivo já é suficiente.
— Prefere o campo? Já pensou no impacto ambiental de morar longe dos centros urbanos?
— Quer construir? Comprovação de efetiva necessidade de cada cômodo da casa, por favor.

Direito de ter filhos
Você deseja ter uma família.
— Com base em qual projeção demográfica?
— Já analisou seu score genético?
— Qual o impacto de mais um ser humano na pegada de carbono da sua comunidade?

E finalmente…
Direito à legítima defesa
Você afirma:
— Quero ter uma arma para proteger minha família.
E ouve:
— Mas por quê? Você sofreu ameaça? Tem boletim de ocorrência? Protocolo de risco? Estudo técnico?
— A polícia está aí pra isso.
— A sua vida pode esperar a viatura chegar.
— E se um ladrão invadir sua casa… ofereça um café. Armas causam violência, já ouviu dizer?

Agora pare. E pense.
Você percebeu o absurdo?
Em nenhuma dessas situações seria razoável comprovar sua necessidade para exercer direitos fundamentais.
Você não precisa justificar por que quer sair de casa.
Você não precisa justificar por que quer falar, aprender, rezar, amar, se reunir ou possuir algo.
Então por que precisa justificar o desejo de defender sua própria vida?
O direito à autodefesa é extensão direta do direito à vida.
Não é concessão. Não é privilégio. Não é favor.
É seu. Por natureza. Por nascimento. Por dignidade.
Exigir a comprovação de efetiva necessidade para possuir uma arma é como pedir laudo técnico para poder respirar.
É uma aberração jurídica. Um insulto moral.
E o sinal claro de que o Estado não reconhece você como um cidadão — mas como um súdito.
Se você precisa pedir autorização para se defender…
…então você já está sendo atacado.