
Por Sandro Christovam Bearare
Com o mercado de formação em armamento e tiro mais estagnado nos últimos tempos, reflexo direto do momento político atual do país, vivemos uma pausa oportuna. Uma pausa que nos permite, finalmente, analisar com mais clareza quem realmente tem contribuído para a construção de uma cultura técnica e segura, e quem apenas ocupou espaço com vaidade, marketing e superficialidade.
Ao longo de quase 16 anos à frente da ProPoint, escola especializada na formação de instrutores, pude observar com nitidez os dois polos que dividem esse cenário. De um lado, o péssimo instrutor. Do outro, o profissional ético, técnico e comprometido com a verdadeira missão de ensinar.

O péssimo instrutor: ego inflado, técnica ausente
O péssimo instrutor é um personagem. Gosta de aparecer. De contar histórias mirabolantes. Veste-se com exagero — e não é o uso do preto em si que preocupa, mas sim o abuso de uniformes táticos completos, do pé à cabeça, em cursos nos quais esse tipo de vestimenta não se justifica. Exceções existem, claro, mas o padrão é de teatralidade.
Ele se enxerga como um operador em campo de batalha. Acredita estar formando mega soldados táticos, como se todos os seus alunos fossem embarcar em uma missão internacional ao final do curso. Usa palavras como “tático”, “SWAT”, “faca na caveira”, “mocorongo”, “bisonho”, “combat” e outras variações de efeito.
Mas quando se trata de ensinar, ele falha. Não tem plano de aula. Não estuda metodologia. Ignora ciência, despreza pedagogia. Fala muito de si, pouco do conteúdo. Alguns evitam até atirar com os alunos, com receio de expor sua baixa destreza. Outros, atiram demais, tentando transformar o curso em um show pessoal.
Seu material publicitário valoriza a estética do combate. Fotos com filtros escuros, banners com explosões, vídeos que mais lembram trailers de filmes de ação do que aulas reais. Seus certificados parecem manuais de forças especiais, repletos de termos em inglês técnico e títulos inflados.
A formação desse tipo de instrutor geralmente é frágil. Poucos cursos presenciais, muito YouTube, alguma vivência esportiva ou passagem militar superficial. Ainda assim, se coloca como mestre absoluto do assunto. E o mais grave: forma discípulos, não alunos. Reproduz técnicas mal embasadas. Reforça vícios perigosos. E, assim, coloca vidas em risco.
O ótimo instrutor: ética, preparo e humanidade
Em contrapartida, o ótimo instrutor é discreto. Seu foco não está em si, mas no aluno. Estuda sempre. Testa. Compara. Atualiza-se. Tem sólida formação técnica, mas também formação pedagógica. Domina a andragogia. Estrutura planos de aula com progressão realista. Sabe adaptar sua linguagem conforme a turma. Evita jargões. Busca clareza.
Esse profissional compreende que ser instrutor não é apenas demonstrar técnica, mas desenvolver pessoas. Não precisa ser agressivo para se impor. Sua liderança vem da segurança que transmite, da lógica que apresenta, da humildade com que compartilha o que sabe.
Ele prepara cada aula com cuidado. Sabe o que vai ensinar, por que vai ensinar e como aquele conteúdo pode ser absorvido da melhor forma. Tem consciência de que cada aluno tem uma trajetória única, e que ensinar é, também, ajustar.
O ótimo instrutor é humano. Atento. Ético. Valoriza o progresso dos seus instruendos. Não forma soldados. Forma cidadãos preparados. Faz da técnica uma ponte para o conhecimento real, e não um espetáculo de vaidade.
O perfil importa e muito
O que separa o péssimo do ótimo instrutor não é apenas o currículo. É a postura. A intenção. A ética. O respeito pela missão de formar alguém para lidar com uma ferramenta letal. Um busca holofotes. O outro, responsabilidade. Um forma seguidores. O outro, atiradores conscientes.
Este texto vem a calhar. Neste mês, completo 16 anos coordenando e formando instrutores. É um orgulho imenso estar à frente da ProPoint, que considero hoje uma das, senão a escola com maior nível técnico e homogeneidade de qualidade na formação desses profissionais no Brasil.
Se há algo que aprendi nessa jornada, é que o verdadeiro instrutor é aquele que coloca o aluno no centro, que ensina com propósito, prepara com método e lidera com humildade. E felizmente, ainda temos muitos deles por aí. Basta saber escolher com critério e atenção.
Bons cursos, bons tiros e sobretudo, boa formação. Porque ensinar armamento é, antes de tudo, uma responsabilidade moral.
Sandro Christovam Bearare
Especialista em armamento, tiro e autodefesa, atuando há mais de 15 anos no setor de segurança e instrução tática. Autor de diversas obras sobre segurança pessoal, autodefesa e combate urbano, além de palestrante e consultor estratégico em gestão de risco e proteção pessoal.
Acesse o perfil acadêmico de Sandro Christovam Bearare no Google Scholar com artigos científicos sobre segurança, autodefesa, inteligência artificial, armas de fogo, psicopedagogia e tecnologias emergentes aplicadas à formação profissional e defesa e segurança pessoal.
Confira: https://scholar.google.com/citations?hl=en&user=7XFDIhkAAAAJ
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