
Na data de 24 de junho de 2025, o Supremo Tribunal Federal deu mais um passo decisivo contra a liberdade individual dos brasileiros. O relator da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 85, Ministro Gilmar Mendes, apresentou relatório e voto favoráveis à constitucionalidade dos Decretos nº 11.366/2023 e nº 11.615/2023. Ambos os decretos, oriundos do atual governo federal, impõem severas restrições ao acesso de civis a armas de fogo, configurando um desmonte profundo da política armamentista que havia se consolidado nos últimos anos.
A ADC 85 foi proposta pela Presidência da República com o claro objetivo de blindar juridicamente os decretos que limitam registros, portes, transferências e aquisição de armas e munições por civis, notadamente colecionadores, atiradores e caçadores (CACs). Sob o pretexto de combater o “armamentismo desenfreado”, o Estado se arroga o direito de controlar, restringir e, na prática, inviabilizar o acesso de civis às ferramentas de legítima defesa.
O voto do relator afirma, com base em precedentes como a ADI 6.139, que “não existe um direito fundamental à posse de armas de fogo no Brasil” e que a concessão deve ocorrer “sempre em caráter excepcional e justificado por necessidade concreta”. Tal interpretação, contudo, ignora o fato de que o controle estatal absoluto sobre a segurança individual já se mostrou não apenas ineficiente, mas inconstitucional frente ao direito à vida e à propriedade.
Gilmar Mendes também sustenta que os decretos seriam uma resposta à suposta desordem armamentista promovida entre 2019 e 2022, período em que se ampliou o acesso regulado às armas no Brasil. A narrativa adotada parte de relatórios do TCU e de ONGs como o Instituto Igarapé, amplamente conhecidos por sua postura ideologicamente contrária ao armamento civil.
A premissa central do voto — de que mais armas legais resultam em mais violência — é falaciosa. Diversos estudos internacionais apontam o contrário: a legalização do armamento responsável, com fiscalização efetiva e treinamento adequado, reduz a criminalidade, sobretudo os crimes patrimoniais e sexuais, por seu efeito dissuasório.
O relator ignora o referendo de 2005, em que mais de 63% da população brasileira rejeitou a proibição da venda de armas. Desconsiderar essa vontade popular em nome de argumentos técnicos ou “proporcionalidade constitucional” revela uma postura autoritária travestida de tecnocracia.
Ao listar os dispositivos dos decretos, o voto celebra a suspensão de registros para aquisição de armas de uso restrito, a limitação de quantitativos de munição, a suspensão de novos clubes de tiro e o recadastramento compulsório. São medidas de viés inquisitorial, que tratam o cidadão como suspeito e não como detentor de direitos.
O Decreto nº 11.615/2023 é apresentado como sucessor “natural” do 11.366, e recebe louvores por “centralizar” o controle no SINARM, sob a Polícia Federal. O que está em curso, contudo, é a retirada das competências do Exército, tradicionalmente mais técnico e menos ideológico nesse tema, e a sua substituição por um aparato mais politizado.
O voto do relator desconsidera que o acesso às armas no Brasil continua — e sempre continuou — sujeito a restrições rigorosas, incluindo avaliação psicológica, treinamento técnico e comprovação de idoneidade. A narrativa de liberalização absoluta é, no mínimo, distorcida.
Mendes chega a evocar o conceito de “proibição de proteção deficiente” para justificar a intervenção do Estado na esfera privada, alegando que a regulamentação anterior seria leniente e causadora de insegurança. Mas não apresenta evidências concretas de que CACs tenham contribuído de forma significativa para os índices de criminalidade.
O relator fundamenta seu voto em princípios abstratos como o direito à segurança pública e à vida — ambos, é verdade, garantidos constitucionalmente — mas esquece que a liberdade também é um bem jurídico fundamental, e que a legítima defesa está prevista no Código Penal.
A obsessão em “reconstruir” a política armamentista revela o objetivo de apagar qualquer vestígio de empoderamento civil. As medidas que limitam a quantidade de armas por atiradores e caçadores, ou exigem autorização prévia para práticas desportivas, ferem o princípio da razoabilidade.
A criação de obstáculos burocráticos e técnicos serve apenas para desestimular o cidadão comum de buscar o direito à legítima defesa. A centralização de poderes e o cerceamento de liberdades são típicos de regimes autoritários — e não de democracias maduras.
A liberdade de acesso a armas não é uma apologia à violência, mas uma proteção contra ela. É uma extensão do direito à vida. Transformar essa liberdade em privilégio seletivo concedido pelo Estado é romper com os fundamentos da própria cidadania.
O Instituto DEFESA, como principal entidade civil de defesa da liberdade armamentista no Brasil, manifesta profunda preocupação com os rumos tomados por essa decisão. Trata-se de um claro retrocesso, que fere não apenas princípios constitucionais, mas também a vontade popular já expressa nas urnas.
Em parceria com o escritório Marluz Lacerda Dalledone & Advogados Associados, o Instituto DEFESA está tomando todas as medidas jurídicas cabíveis para contestar o conteúdo e os efeitos do voto proferido, inclusive por meio de ações nacionais e internacionais de advocacia e mobilização.
É importante lembrar que nenhum decreto pode substituir ou revogar a Constituição. O controle de constitucionalidade não pode ser transformado em ferramenta ideológica para promover pautas estatais de dominação.
O precedente que hoje se estabelece é grave: ao legitimar a desconstrução de garantias individuais por decreto, o STF abre a porta para novas formas de autoritarismo legalizado, cujo alvo pode amanhã ser qualquer outra liberdade que incomode o governo de ocasião.
O desarmamento é, historicamente, um dos primeiros passos de regimes que desejam o controle total sobre a população. Os brasileiros devem permanecer atentos e mobilizados para evitar que o país caia novamente sob a sombra do despotismo.
A luta do Instituto DEFESA não termina aqui. Pelo contrário: ela se intensifica. Seguiremos defendendo, nos tribunais, nas ruas, na internet e em todas as instâncias possíveis, o princípio inegociável de que a liberdade é um direito natural e que a legítima defesa é sua mais legítima expressão.
Acompanhe o processo diretamente no site do STF via https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6572942