
No longo curso da história, o controle de armas nas mãos da população tem sido um movimento recorrente entre governos que almejam estabilidade — ou, segundo alguns analistas, hegemonia. Um dos episódios mais antigos e emblemáticos desse tipo de política ocorreu no Japão feudal, durante o chamado Período Tokugawa, que se estendeu de 1603 a 1868.
Antes mesmo da consolidação oficial do xogunato Tokugawa, em 1588, o então líder militar Toyotomi Hideyoshi instituiu um decreto que entraria para a história: o “Katanagari”, ou “Caça às Espadas”. A medida proibia camponeses de portarem espadas ou armamentos de uso militar. O discurso oficial era claro — manter a ordem pública e restringir o uso de armas à classe guerreira dos samurais, fiel ao governo.
Mas, segundo estudiosos do período, o real objetivo ia além da segurança. Hideyoshi temia o mesmo tipo de revolta que o levou ao poder. O desarmamento, portanto, seria uma medida preventiva contra futuras insurreições populares. A estratégia surtiu efeito. Durante mais de dois séculos, o Japão viveu sob rígida estrutura de castas, com o monopólio da força concentrado nas mãos da elite militar. Rebeliões armadas tornaram-se praticamente impossíveis.

Instagram: @nor_084
Este padrão, contudo, não é exclusivo do Japão. Ao longo do século XX, regimes autoritários como os da Alemanha nazista, da União Soviética, de Cuba e da Venezuela adotaram políticas semelhantes: desarmar a população antes de consolidar o poder. A lógica é direta — uma sociedade desarmada oferece menor resistência ao controle do Estado. Mais do que uma medida de segurança, o desarmamento histórico levanta um debate que segue atual. Estaria o Estado protegendo o povo — ou protegendo-se do povo?
No Japão feudal, a proibição do porte de armas pelos camponeses extinguiu não apenas o risco de rebeliões, mas também o direito à autodefesa. Um direito que, ainda hoje, em muitas partes do mundo, permanece no centro das discussões sobre liberdade, segurança e poder. Essa lógica permanece atual.
Sempre que um governo busca restringir o acesso às armas dos cidadãos comuns, é importante questionar: isso é realmente por segurança pública, ou é uma tentativa de concentrar ainda mais o poder?
Sobre o autor:
Instagram: @nor_084
Saulo Noronha
84-9-8877-0577