
1. Antes de 2011: Um país com legislação flexível, mas em crise de segurança
Antes de 2011, o Equador possuía uma legislação que, embora regulamentada, permitia a posse e o porte de armas por parte de civis mediante autorização emitida pelas Forças Armadas. Era necessário apresentar justificativas para o uso do armamento, passar por exames psicológicos e justificar a necessidade de porte. Esse sistema, embora burocrático, ainda garantia a milhares de cidadãos equatorianos o direito de se protegerem.
Durante essa época, a taxa de homicídios no país oscilava entre 15 e 18 por 100 mil habitantes. Os principais fatores relacionados à violência incluíam a atuação de gangues locais, o tráfico de drogas na fronteira com Colômbia e Peru, e a ineficiência das instituições estatais em prover segurança pública. A violência, embora difusa, já era um problema grave para o cidadão comum, sobretudo nas áreas urbanas mais pobres.
Nessa fase, o mercado de armas legal funcionava de forma controlada, mas ativa. Comerciantes e fabricantes operavam sob supervisão militar, e o controle de munições e calibres também era rigoroso. Contudo, não havia uma diretriz política clara voltada ao desarmamento civil como princípio.
Havia uma percepção crescente de que a violência era mais um problema institucional do que de armamento em si. Muitas lideranças comunitárias clamavam por maior presença do Estado e não por restrições ao direito de defesa. Ainda assim, setores políticos alinhados às ideias do desarmamento começavam a ganhar força no discurso público.
Esse contexto preparou o terreno para a mudança radical que viria com o governo de Rafael Correa, marcado por uma guinada ideológica e centralizadora, inclusive na gestão da segurança pública e no controle sobre o armamento da população civil.
2. 2011: Rafael Correa e o marco inicial do desarmamento
Em maio de 2011, o presidente Rafael Correa decretou o Decreto Executivo nº 749, que suspendeu indefinidamente a emissão de novas permissões para o porte de armas por civis. A decisão foi apresentada como parte de um pacote de segurança pública, baseado na ideia de que “menos armas nas ruas significaria menos crimes”.
A medida foi drástica e surpreendeu até mesmo setores do próprio governo. Ela representou uma ruptura com a tradição de regulamentação equilibrada que o país vinha mantendo. A partir desse ponto, a maioria dos cidadãos ficou impedida de obter licenças legais para porte, mesmo em situações de risco comprovado. Apenas seguranças privados e pessoas com alto risco de vida podiam solicitar permissão, e mesmo assim com extrema dificuldade.
O decreto também deu início a uma campanha de apreensão de armas, fiscalizações e desmantelamento de comércios especializados. Além disso, promoveu um discurso público fortemente ideológico, comparando o direito à autodefesa à “selvageria” e colocando a responsabilidade pela segurança exclusivamente nas mãos do Estado.
As taxas de homicídio, naquele momento, estavam em torno de 18 por 100 mil habitantes. O governo usou os dados dos anos seguintes para afirmar que o desarmamento estava funcionando, sem levar em conta outras variáveis como as reformas policiais e os programas sociais implementados no mesmo período.
Esse decreto não apenas mudou a política de armas, mas também consolidou um novo modelo de controle estatal sobre o cidadão comum, retirando-lhe a prerrogativa de responder à violência com meios próprios. Foi o início de um desarmamento civil que duraria mais de uma década.

3. 2012 a 2017: Queda nas taxas de homicídio e uso político do desarmamento
Nos primeiros anos após o decreto de 2011, o Equador de fato experimentou uma queda constante nas taxas de homicídio. De 12,4 por 100 mil habitantes em 2012, os números caíram para 10,6 em 2013, 8,2 em 2014 e 5,8 em 2017. O governo usou esses dados para reforçar a narrativas de que desarmar os cidadãos levava à paz.
Entretanto, várias outras medidas foram adotadas paralelamente. O governo Correa investiu na modernização da Polícia Nacional, implantou sistemas de videomonitoramento urbano, aumentou o efetivo policial e criou programas sociais voltados à juventude pobre e marginalizada. Esses fatores também contribuíram para a redução da criminalidade, mas foram ignorados na análise oficial.
Durante esse período, o desarmamento foi transformado em política de Estado. A posse de armas se tornou um privilégio praticamente inalcançável para o cidadão comum. As campanhas governamentais reforçavam a ideia de que não haveria segurança sem o monopólio estatal da força, ignorando o crescimento subterrâneo do crime organizado.
A repressão ao mercado legal criou um ambiente favorável ao mercado negro de armas, alimentando o arsenal de gangues e grupos paramilitares. Apesar da aparente paz estatística, muitos analistas alertavam para um risco latente: a população honesta estava vulnerável, enquanto criminosos seguiam armados.
Esses anos de queda na violência foram, portanto, multifatoriais. O desarmamento civil pode ter tido efeito pontual, mas sua contribuição foi sobrestimada em nome de uma agenda ideológica que, como se veria adiante, não sustentaria a segurança por muito tempo.
4. 2018 a 2022: A explosão da violência e o fracasso do desarmamento
A partir de 2018, o Equador entrou em uma nova era de criminalidade. Mesmo com a população civil ainda amplamente desarmada, as taxas de homicídio começaram a subir rapidamente. Em 2018 foram 5,84 por 100 mil hab.; em 2019, 6,84; em 2020, 7,8. Em 2021, o salto foi drástico para 14,04 e em 2022 chegou a 25 por 100 mil hab.
Essa explosão da violência coincidiu com a entrada massiva de grupos criminosos transnacionais no país, como o cartel de Sinaloa e facções locais como “Los Choneros”. O sistema penitenciário foi tomado por facções e vários massacres aconteceram dentro das prisões, com dezenas de mortos.
Com a população desarmada, a criminalidade encontrou pouco ou nenhum obstáculo. O Estado se mostrou incapaz de garantir a ordem, e cidades como Guayaquil e Esmeraldas tornaram-se centros de violência, execuções públicas e ataques com explosivos.
Mesmo diante do agravamento da crise, as leis de controle de armas seguiram inalteradas. A população assistia impotente à escalada da barbárie, sem acesso a meios legais de defesa. Os poucos que possuíam armas legalizadas não tinham mais permissão para portá-las fora de casa.
Esse período expôs de forma brutal a falácia da segurança baseada exclusivamente no desarmamento civil. A criminalidade armada prosperou, e o cidadão comum, desarmado, tornou-se presa fácil.

5. 2023: A guinada do presidente Guillermo Lasso
Em 2023, diante de um colapso generalizado na segurança, o presidente Guillermo Lasso tomou uma medida histórica: revogou parcialmente a proibição de porte de armas para civis. Pela primeira vez em mais de uma década, o Estado equatoriano reconhecia que não era capaz de proteger todos os cidadãos.
O novo decreto de Lasso autorizou o porte para autodefesa, mediante regras como exame psicológico, antecedentes criminais e justificativa. O presidente afirmou publicamente que “o direito à legítima defesa é um direito natural” e que os cidadãos não podiam continuar indefesos diante do crime.
A decisão teve forte impacto simbólico, rompendo com anos de discurso desarmamentista. Embora o efeito prático ainda seja limitado (devido à lentidão da burocracia e do medo de perseguição legal), milhares de cidadãos passaram a considerar o armamento como solução viável.
O ano de 2023, no entanto, encerrou-se com a mais alta taxa de homicídios da história do país: cerca de 45 por 100 mil habitantes. Isso mostra que a mudança de política, apesar de correta, chegou tarde, e que a reconstrução da cultura de autodefesa ainda levará tempo.
Lasso abriu a porta para uma nova abordagem. O Equador começa, aos poucos, a reconhecer que não se combate o crime desarmando as vítimas, mas sim fortalecendo os indivíduos contra agressores armados.

6. O desarmamento como parte do problema, não da solução
A história do Equador mostra de forma inequívoca que o desarmamento civil, isoladamente, não produz segurança sustentável. Embora tenha havido uma queda inicial nos homicídios entre 2012 e 2017, ela esteve relacionada a um conjunto amplo de políticas públicas, e não exclusivamente à retirada de armas das mãos dos cidadãos.
Quando essas outras políticas se enfraqueceram e o crime organizado cresceu, o desarmamento mostrou seu verdadeiro efeito: deixou uma população inteira vulnerável. As taxas de homicídio dispararam, os massacres se tornaram rotina e o Estado perdeu o controle de diversas regiões.
A tentativa de conter o caos com base apenas na proibição de armas legais se revelou um fracasso. A violência aumentou justamente quando a população estava mais desarmada. E isso demonstra que o monopólio estatal da força não é garantia de paz, mas sim de submissão.
A partir de 2023, com Guillermo Lasso, iniciou-se uma nova etapa. Ainda que limitada, a mudança abre a possibilidade de um país mais equilibrado, onde o cidadão comum possa exercer sua legítima defesa de forma legal e eficaz.
O Equador se torna, assim, um exemplo didático para toda a América Latina: o desarmamento civil pode ser vendido como solução, mas quando a realidade impõe sua lógica, é a coragem armada do povo que faz a diferença entre viver e morrer.

O gráfico Taxa de Homicídios vs Arma em Circulação no Equador, mostra com clareza a evolução inversamente proporcional entre as duas variáveis entre 2011 e 2023. Durante o governo Rafael Correa, especialmente a partir do decreto de 2011 que suspendeu o porte civil, o número estimado de armas em circulação caiu gradualmente ao longo dos anos seguintes. No mesmo período, houve uma redução na taxa de homicídios, o que inicialmente deu suporte político à narrativa do desarmamento como ferramenta eficaz de segurança pública.
No entanto, a partir de 2018, observa-se uma mudança drástica: enquanto a quantidade de armas em circulação continuava relativamente baixa e estável, as taxas de homicídio começaram a subir de forma alarmante. Esse aumento coincidiu com a expansão das atividades do narcotráfico e a consolidação de grupos criminosos no país. A ausência de meios eficazes de autodefesa civil, somada à fragilidade institucional, expôs a população à violência generalizada — culminando em 2023 com uma taxa de homicídios que chegou a quase 45 por 100 mil habitantes, a mais alta da história recente do país.
O gráfico evidencia que, ao contrário do discurso desarmamentista, a limitação do acesso às armas não garantiu a redução sustentada da violência. Quando o Estado falha em garantir a segurança pública, negar aos cidadãos o direito à legítima defesa resulta não em paz, mas em vulnerabilidade. A recente flexibilização do porte de armas pelo governo Lasso reflete essa percepção crescente: de que a liberdade de acesso à autodefesa pode ser não apenas um direito, mas uma necessidade em face do colapso estatal.
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