Introdução ao Combate Armado em Baixa Luminosidade – Parte 1

Lucas Silveira é presidente do Instituto DEFESA.

INTRODUÇÃO

O combate armado envolve precisão, intensidade e velocidade. Envolve também a premeditação, a leitura da arena, a identificação positiva de alvos, a perfeita técnica de manuseio do equipamento, e incontáveis outros fatores.

Em um ambiente com a luminosidade comprometida, sua lanterna torna-se tão importante quanto a sua arma.N ão importa qual cenário você esteja analisando, nem sob quais critérios ou contextos. Tudo ficará mais fácil se estiver bem iluminado.

Nesse contexto se inserem as técnicas de combate em baixa luminosidade. Uma busca pelo melhor emprego do que estiver disponível ao combatente inserido em um cenário em que a visibilidade se distancia do ideal, seja pela penumbra, pelo comprometimento do ar com elementos indesejados ou por quaisquer outros fatores que comprometam a capacidade visual do operador.

Abre-se um leque de possibilidades, que abrange desde a estratégia, passando pela tática, até chegar na técnica. Nessa parte introdutória, dar-se-á ênfase a técnica, que pode ser dividida pedagogicamente em:

  1. Técnicas de combate armado em baixa luminosidade com lanternas táticas
  2. Técnicas de combate armado em baixa luminosidade com lanternas comuns
  3. Técnicas de combate armado em baixa luminosidade com iluminação dedicada
  4. Técnicas de combate armado em baixa luminosidade sem iluminação auxiliar
  5. Outras técnicas de combate armado em baixa luminosidade

 


 

1. Técnicas de combate armado em baixa luminosidade com lanternas táticas

1.1. Considerações iniciais

Conforme apontado na introdução, existem diversas formas de se abordar um combate armado. No caso específico do capítulo 1, estamos tratando do uso simultâneo de uma arma de fogo e uma lanterna classificada como “tática”.

Como portar, sacar, recarregar e empunhar sua arma e sua lanterna, minimizando os inexoráveis efeitos da perda da qualidade na empunhadura?

Existem algumas opções que serão apresentadas a seguir. A recomendação é que o operador conheça cada uma delas, observe a que melhor serve e guarde as demais consigo, para algum uso extraordinário.

1.2. O que faz uma lanterna ser “tática”?

Não existe consenso. Se você vir uma definição por aí, é mera especulação, a opinião do autor, exatamente como a que vamos fazer agora. Portanto, não se prenda a este termo. Use-o apenas para fins pedagógicos.

Vou escrever um texto em breve sobre essa moda “tática”, na qual vendem até pirulitos ou lápis táticos, sem nenhuma conexão com o real sentido da palavra.

Para ter uma ideia, vejamos o que diz o dicionário Michaelis:

tática
tá.ti.ca
sf (gr taktiké) 1 Arte de empregar as tropas no campo de batalha com ordem, rapidez e recíproca proteção, segundo as condições de suas armas e do terreno.2 Habilidade ou meios empregados para sair-se bem de qualquer negócio ou empresa. Var: táctica. T. naval: arte de fazer evoluções com os navios de guerra. Ter tática da vida: ter grande conhecimento do mundo.

tático2
tá.ti.co2
adj (tato+ico2) Relativo ao ou próprio do tatismo.

 

Ué, não tem nada a ver com aquela calça camuflada que você comprou no Mercado Livre por uma pechincha, não é? Talvez o Michaelis não seja um bom dicionário. Vamos ver o que diz o Priberam:

tá·ti·ca |át|
(francês tactique, do grego taktikê, feminino de taktikos, , -ón, próprio para arranjar, para ordenar)

substantivo feminino

1. [Militar]  Arte de dispor e de empregar as tropas, no terreno, onde devem combater.

2. [Figurado]  Habilidade, jeito para dirigir qualquer situação ou negócio.

tá·ti·co |át| 1

(francês tactique, do grego taktikos, , -ón, próprio para arranjar, para ordenar)

adjetivo

1. Relativo à .tática.

substantivo masculino

2. Indivíduo perito em .tática.

Agora não tem jeito. Parece mesmo que esta palavra foi distorcida ao longo da história (e do marketing).
Como dito acima, nosso objetivo neste texto não é desmistificar este termo incorretamente utilizado, por enquanto. Vamos fingir que não sabemos disso, e manter a classificação exclusivamente para fins pedagógicos.
Assim, para efeito deste texto, mesmo sabendo semanticamente incorreto, vamos considerar táticas as lanternas que tenham:
Surefire E2D Led Ultra. Exemplo de lanterna que será considerada tática, apenas para os fins pedagógicos deste texto.

Surefire E2D Led Ultra. Exemplo de lanterna que será considerada tática, apenas para os fins pedagógicos deste texto.

a) Dimensões compactas
b) Fluxo luminoso (lumens) suficiente para cegar momentaneamente um inimigo olhando para a fonte de luz
c) Botão de acionamento na parte traseira
d) Acionamento intermitente opcional

 

Não serão consideradas táticas, apenas para os fins deste texto, por exemplo, as lanternas:

rayovac1

Lanterna multiuso Rayovac. Um exemplo de lanterna que não será considerada tática apenas para os fins pedagógicos deste texto.

a) Grandes, que normalmente utilizam pilhas C, ou D

b) Que sejam acionadas por rotação, botão deslizante ou switches precários

c) Que não tenham capacidade de iluminação suficiente para cegar momentaneamente o inimigo

d) Que funcionem a dínamo

e) Lanternas de cabeça, de celulares, de bicicletas

e) etc.

 

1.3. O conceito PDM – Piscar, Disparar, Movimentar

Este tópico é um liame entre a técnica e a tática. Entre saber o que fazer e saber como fazer.

Se você tem uma lanterna em um confronto de baixa luminosidade, deve assegurar que sua ferramenta seja útil exclusivamente a você, e jamais ao seu inimigo.

Uma lanterna constantemente acesa é uma gentileza que se faz ao inimigo, apontando para ele o exato local onde mirar,

Assim se contextualiza o conceito PDM. Sua lanterna será usada exclusivamente para fazer uma identificação rudimentar do alvo, jamais para fazer o alinhamento de alça e massa de mira, ou para iluminar o ambiente como se fosse uma lâmpada comum.

Portanto, ao utilizar sua lanterna, use apenas um pequeno “flash” de luz, uma piscadinha suficiente para efetuar um (ou mais) disparo com a pontaria instintiva. Em seguida movimente-se o mais rapidamente possível, de maneira que o seu inimigo, na penumbra, não saiba com precisão onde você se encontra.

Para nos lembrarmos disso, fazemos o mnemônico PDM: Piscar, Disparar e Movimentar.

 

1.4. Empunhaduras básicas de pistola e lanterna “tática”

Todo filme de ação que se preze tem uma cena de entrada em local escuro. A tensão é maior, e a baixa luminosidade facilita o suspense hollywoodiano típico. Com frequência o herói do filme apoia o a mão da arma sobre o antebraço da lanterna, o que dá uma aparência de extrema perícia do mocinho. Super “tático”.

Por que o protagonista fez isso? Que empunhadura esquisita é esta? Esta é a melhor forma de se usar as duas ferramentas simultaneamente?

Vejamos as principais formas de se utilizar uma pistola e uma lanterna “tática” não dedicada simultaneamente.

 1.4.1. Técnica do FBI

fbi1

Nesta técnica o operador empunha a pistola ou revólver com sua mão dominante. Na mão fraca segura-se a lanterna, bem afastada do corpo, com o braço estendido.

A tese por trás disto é que o portador da lanterna não entrega sua posição exata ao acendê-la, além de “atrair” eventuais disparos para próximo da lanterna, e não para o seu tronco.

1.4.2. FBI Modificada

fbi2

Imagine passar vários minutos com o braço estendido segurando uma lanterna. Cansativo, não é?

Na técnica FBI modificada, o braço da lanterna não precisa ficar constantemente estendido, podendo acionar a lanterna em locais diferentes, mas distantes da arma e do tronco.

1.4.3. Chest Index

chest1

A técnica consiste em posicionar a lanterna em frente ao esterno, perpendicularmente ao tronco do operador. A teoria é de que, fixa nesta posição, a lanterna sempre iluminará a frente do operador, deixando-o atento exclusivamente ao manuseio do armamento.

Além disso, a luz também acessará o dispositivo de pontaria da pistola, o que pode ajudar muito em especial aqueles que têm alça e maça comuns, sem trítio.

1.4.4. Neck index

neck1

Semelhante à chest index, no neck index o operador posiciona a lanterna entre a sua articulação temporomandibular e o trapézio, um pouco a frente do rosto, para evitar se auto-iluminar.

1.4.5. Surefire/Rogers

sure1 sure2

Esta técnica só pode ser usada com lanternas que tenham botões de acionamento apropriados para a empunhadura em questão. Na empunhadura Surefire, deve-se posicionar a lanterna entre os dedos indicador e médio, apoiando o botão de acionamento na palma da mão. Assim, quando se pressiona a lanterna contra a palma da mão, ela acende.

Esta é a empunhadura que mais se aproxima da empunhadura normal do armamento, sem o uso da lanterna. Todavia, o controle do feixe de luz depende da precisão de empunhadura, tornando-se ligeiramente impreciso.

Outro ponto negativo é que você estará apontando sua arma para tudo que deseja iluminar, o que pode contrariar uma regra básica de segurança com armas de fogo.

1.4.6. Harries

harries

Esta é a campeã de Hollywood. Na empunhadura Harries, a mão da arma é posicionada sobre o antebraço da lanterna. Ambos os dorsos das mãos devem se tocar e exercer uma ligeira pressão entre si, conferindo maior estabilidade  nos disparos.

É mais simples de ser executada, se comparada com a Surefire, todavia é melhor aproveitada na posição Weaver, sendo desaconselhada para as demais posições.

Da mesma forma que na Surefire, nesta técnica o operador sempre aponta a arma para aquilo que ilumina. Pode não ser inteligente fazer isso ao se procurar, por exemplo, seu filho na sua sala de estar.

 1.4.7 Variações

Estas são as principais empunhaduras de pistola e lanternas “táticas” simultaneamente. A maior parte dela possui variações, como a Harries com o antebraço da lanterna por cima do antebraço da pistola (o que não faz nenhum sentido) ou a chamada “eye index”, por exemplo, na qual a lanterna é posicionada na altura dos olhos ao invés do pescoço.

 

1.5. Considerações finais

Conheça e treine cada uma destas técnicas. É provável que o mais inteligente seja a capacidade de alternar entre uma empunhadura e outra, de acordo com o cenário em que se está atuando.

Por exemplo, em uma busca em ambiente confinado você pode preferir a FBI ao invés da Harries. No caso de ser surpreendido, da mesma forma, você pode não conseguir montar uma posição mais complexa como a Surefire, mas certamente a “chest index” vai sair quase automaticamente, e assim por diante.

Se você já tiver treinado com todas estas possibilidades e tiver uma ou outra predileta, tudo ficará mais fácil.

 


 

Inscreva-se no Instituto DEFESA e fique informado da continuidade deste texto. Ainda está por vir:

  • Técnicas de combate armado em baixa luminosidade com lanternas comuns
  • Técnicas de combate armado em baixa luminosidade com iluminação dedicada
  • Técnicas de combate armado em baixa luminosidade sem iluminação auxiliar
  • Outras técnicas de combate armado em baixa luminosidade
  • Técnicas intermediárias de combate armado em baixa luminosidade (inclui técnicas de recarga e solução de panes)
  • Técnicas avançadas de combate armado em baixa luminosidade

24 Replies to “Introdução ao Combate Armado em Baixa Luminosidade – Parte 1”

  1. Muito interessante esta matéria, tive treinamentos ainda quando estava no Exército, mas não com tanta ênfase como aqui descrito nestas linhas.
    Parabéns, continuarei aqui no aguardo desta continuidade prometida por vossas senhorias.
    Obrigado e excelente trabalho.
    Cordialmente

  2. Acredito hoje ter em uma pagina dessas o que a de melhor no assunto, bem por isso vejo que até o cuidado de equalizar assuntos se tem, a tempo, algumas dessas na matéria acima são bem conhecidas em nosso meio(militar), porém sempre nos reforça e convicto de que a vida é nossa máxima prioridade, vou fazer uma observação que talvez sejam lhe uteis a outras publicações:
    A VIDA …
    A = ABRIGAR-SE
    V = VISUALIZAR
    I = IDENTIFICAR O ALVO, bem como agressor, arma, vitima etc
    D = DENOMINAR AÇÃO, proteger-se e aguardar, avançar com cautela etc
    A = AGIR, Somente depois de todos anteriores você pode agir com segurança junto ao teatro apresentado.
    Grato pela oportunidade,espero ter gostado do singelo comentário,
    Mauricio. 2Sgt Comaer,

  3. Parabéns Lucas.
    Os leitores podem concluir que tudo esta lastreado nos Princípios do Tiro, ou, especificamente Fundamentos do Tiro: POSTURA, VISADA, RESPIRAÇÃO, ACIONAMENTO DA TECLA DE DISPARO. Quando se tem essa base todos os demais complementos serão acessórios muito bem vindos, que nutre desde os Agentes Públicos até ao cidadão de bem para a defesa própria. Estudos e treinamentos constantes tornam o operador apto a agir em situação de crise extrema APRIMORA. “Já passei por alguns perrengues e percebi a importância do treinamento” nem sempre estimulado ou patrocinado pelo Estado, desde a ANP do DPF passando pelas Academias Estaduais Civil e Militar. Em sendo, meu caro, nesse lanço, muitos têm o dever de buscar instrução externa para o seu aprimoramento e assim oferecer respostas assertivas em situações de crise com o uso progressivo da força, o que ca entre nós, não é nada fácil nas frações de segundos. A técnica ‘primitiva’ do uso de lanterna pelo FBI serve para varredura de ambiente, é muito utilizada e a segunda, que eu denomino técnica francesa ou Harries é sem duvida a mais ‘funcional’ pratica, depois daquelas em que a lanterna fica acoplada diretamente no trilho dos equipos que ‘particularmente’ não adoto por questões meramente pessoais. Enfim, há varias informações que podem ser compartilhadas para empreender conhecimento sempre. É importante para o aprendizado constante e quem ensina, aprende duas vezes, dai sucessivamente. Parabéns Garoto, pelo esforço, empenho e a ilustração de temas fundamentais para o esporte, pratica ou uso de equipamento de tiro.

  4. Tenho minhas duvidas em relação ao uso de lanternas táticas para combate,acho q só serve p caça,se um dia estiver em combate e ver um inimigo com uma lanterna vou procurar abrigo e efetuar 4 ou 5 disparos numa circunferência do foco da lanterna, aposto q ele cai.

    1. Vc esta correto. Mas como proceder em varreduras em ambiente sistêmico hostil confinado, aeronaves, embarcações, edificações ou congeneres, onde a incursão é exigida? É como a melhor pistola. O melhor é o que calça para cada operação jamais uma única regra.

    1. concordo. o direito a defesa é de natureza humana de uma forma bíblica ou cientifica. na natureza todo ser vivo possui técnicas de defesa. assim como a constituição americana o cidadão te garantido por lei o porte legal e o direito a uso em defesa pessoal e propriedade, aqui com a legislação brasileira nos deixando indefesos dar aos bandidos total liberdade de ação contra a vida de todos os cidadãos.

  5. não sou militar, mais entendo que em certas situações o uso da lanterna pode identificar sua posição, acredito que deve ser mais eficaz na pratica assalto onde o inimigo quando localizado é tomado de surpresa e neutralizado.

  6. Excelente publicação… Tenho dúvidas quanto as lanternas que vão acopladas diretamente aos trilhos das armas… São boas opções? Possivelmente têm o mesmo inconveniente da técnica Harries, mas e as vantagens?

  7. Gostei muito achei importante que existe brasileiros dispostos ainda a lutar por nossos direitos de cidadãos cumpridores de seus deveres e sem direito algum,parabéns a todos e apoio plenamente o direito deter uma arma,minha reação depende de sua ação.

  8. Parabéns a todos que fazem o Instituto DEFESA,achei muito importante a preocupação de vocês em instruir as pessoas que acham que deter a posse de uma arma é estar segura,precisa ter conhecimentos de uso e responsabilidades legais,eu apoio a campanha .

  9. Excelente!
    Muitos não dão a devida importância ao uso da lanterna em situação de baixa luminosidade. No entanto, a maioria dos confrontos armados que resultaram em baixas para policiais ocorreram em penumbra. O uso correto da lanterna é útil para equalizar a diferença de luz, de um ambiente para outro, evitando efeitos cone de luz, funil fatal, etc, além de ser considerado um meio de escalonamento do uso da força, uma vez que auxilia na identificação do risco e incapacitação temporária do oponente.

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